Poucas
coisas exercem, sobre crianças e adolescentes, tanta atração quanto TV,
internet e games. Criados em um ambiente repleto de tecnologia, esses
jovens passam boa parte do dia (e também da noite) assistindo a filmes,
navegando páginas da rede ou buscando derrotar um inimigo virtual para
avançar para a próxima fase de seu jogo favorito. A despeito das
enriquecedoras descobertas que fazem nesses campos, eles não devem,
contudo, ser deixados à própria sorte nessas aventuras, sob pena de
sofrerem diversos distúrbios. Essa é uma das conclusões do relatório
Health Effects of Media on Children and Adolescents (Efeitos da mídia
sobre a saúde de crianças e adolescentes), uma compilação de dezenas de
estudos científicos da Academia Americana de Pediatria (AAP) publicada
recentemente. [...]
VEJA.com
procurou especialistas brasileiros para entender se as questões que
atormentam pediatras, pais e professores americanos também se aplicam ao
Brasil. A resposta é "sim". A primeira evidência disso são os números.
Segundo os dados americanos, crianças e adolescentes dedicam cerca de
sete horas diárias aos meios eletrônicos (TV, celular, game, web). A
atividade só é superada em número de horas pelo repouso noturno. Por
aqui, a situação não é muito diferente: os brasileiros entre 4 e 11 anos
passaram mais de cinco horas só diante da TV em 2009, segundo o Ibope
Mídia.
Observar,
participar e limitar. Essas são recomendações a serem seguidas
exaustivamente pelos pais que não querem se deparar com problemas no
futuro. "Os pais precisam dosar o conteúdo e principalmente fazer
companhia para as crianças", defende Ana Margareth Bassols, chefe do
serviço de psiquiatria da infância e adolescência do Hospital de
Clínicas de Porto Alegre. Victor Strasburguer, organizador da compilação
americana, vai no mesmo sentido: "Uma criança de cinco anos não precisa
de celular; aos dez, ela não precisa de celular com câmera. As crianças
não precisam de conexão com a internet ou de TV em seus quartos. Acho
que os pais precisam fazer mais do que fazem atualmente sobre essa
questão", sentencia o pediatra.
Segundo
os estudos americanos, uma TV no quarto aumenta em 31% o risco de um
jovem desenvolver sobrepeso. "Vivemos uma epidemia de obesidade no
mundo. Certamente a propaganda de alimentos ricos em sal, açúcar e
gorduras, o tempo que as crianças ficam na frente da TV e os videogames
contribuem para essa epidemia", afirma a nefrologista pediátrica Noêmia
Perli Goldraich, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).
Manter
computador ou TV no quarto dos filhos impede os pais de controlar o que
acontece a portas fechadas. Por exemplo, uma criança que deveria dormir
às 22h pode estender o bate-papo on-line por mais duas horas sem que os
pais percebam. Substituir as horas de sono para permanecer conectado à
web ou para ver filmes também pode trazer impactos para o
desenvolvimento, explica Márcia Pradella Hallinan, neurologista e chefe
do setor de crianças e adolescentes do Instituto do Sono da Universidade
Federal de São Paulo (Unifesp).
Os
pais devem estar vigilante também aos locais virtuais onde as crianças
navegam. Controlar é preciso, mas deve-se evitar radicalismos, como a
imposição de regras muito duras. "Proibir o uso ou bloquear o acesso é
totalmente fora da realidade atual. Eles vão arrumar alguma forma de
acessar, seja na casa do amigo ou em uma lan house. O ideal mesmo é
supervisionar", prega Renata Waksman, pediatra do Hospital Israelita
Albert Einstein, de São Paulo.
Os
médicos também devem entrar nessa batalha, defendem em uníssono o
relatório americano e os especialistas brasileiros. "Os pais devem pedir
esclarecimento aos pediatras e se comportar de acordo com a faixa
etária do filho. Trazer questionamentos para a consulta faz com que isso
seja mais discutido", diz Ricardo Halpern, presidente do departamento
de Saúde Mental da Sociedade Brasileira de Pediatria. Professores também
são fundamentais na orientação das crianças. De acordo com o relatório
da AAP, porém, as escolas não têm acompanhado o ritmo das inovações
tecnológicas no campo da informação e entretenimento. Vânia Lúcia
Quintão, da Faculdade de Educação da Universidade de Brasília, acredita
que é preciso desenvolver o senso crítico nos pequenos. "É importante
que a escola faça uma ponte entre o que as crianças assistem e o que
elas entendem. Para isso, é necessário que o professor conheça a cultura
infantil, ou seja, o que as crianças consomem."
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